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terça-feira, outubro 25, 2011

Ministério Público e Afastamentos : Modelo Constitucional e Transtorno de Identidade






Deu no Blog do Frederico Vasconcelos:

"Procurador de Justiça atua em empresa privada

CNMP apura licença concedida pelo MP de Minas Gerais

O CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) examina decisão do Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Minas Gerais que, atendendo a um pedido do governador Antonio Anastasia, liberou o Procurador de Justiça Fernando Antunes Fagundes Reis para ocupar a diretoria jurídica da Light S/A, no Rio de Janeiro.

Trata-se de empresa privada cujo controle acionário pertence ao Estado de Minas Gerais.

Inconformados com a liberação, membros do MP mineiro recorreram ao CNMP para tentar anular a decisão do Procurador Geral de Justiça.

Além da alegada incompatibilidade, por se tratar de empresa privada, o procurador deverá ganhar bem mais do que no MP estadual.
O fato foi revelado em agosto pelo jornal "Hoje em Dia", de Belo Horizonte: "A indicação do procurador Fernando Fagundes foi recomendada ao procurador-geral de Justiça, Alceu José Torres Marques, pelo governador Antonio Anastasia (PSDB), sendo aprovada por oito votos a dois em reunião do órgão colegiado do MPE no último dia 17 de agosto".

Ainda segundo a publicação, a procuradora-conselheira Nadja Kelly argumentou que o remanejamento só se justificaria se fosse motivado pelo “interesse público” ou para a realização de “atividade de relevância” para o MPE.

Ela entendeu que há conflito de interesse, pois a Light é controlada pela Cemig que, por sua vez, é ré em diversas ações de consumidores movidas pelo MPE.
O CNMP instaurou Procedimento de Controle Administrativo a partir de representação, com pedido de liminar, formulada pelo Procurador de Justiça do Estado de Minas Gerais Márcio Gomes de Souza e pelos Promotores de Justiça de Minas Gerais Carlos Henrique Tôrres de Souza, Heleno Rosa Portes e Mário Konichi Higuchi Júnior (*).

Eles alegam que a empresa possui natureza essencialmente privada e que o ato do MP de Minas Gerais é flagrantemente inconstitucional, por afrontar as disposições do art. 128, §5º, II, b e d da Constituição Federal, não guardando qualquer relação com o previsto no art. 129, IX da Carta da República.

Argumentam, ainda, que a concessão da licença viola disposições legais, como as previstas no art. 44, incisos II e IV, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/1993) e no art. 11, incisos II e IV, da Lei Complementar 34/1994.

Os reclamantes entendem que a licença teve motivação política, e sugerem a requisição de cópia do áudio da sessão do Conselho Superior que apreciou o pedido da mencionada licença, para que o conselho conheça os reais motivos da decisão.

O pedido foi distribuído para o conselheiro Alessandro Tramujas Assad, procurador de Justiça em Roraima.

O relator entendeu que a "licença a Procurador de Justiça daquela unidade ministerial para o desempenho de atividades perante sociedade subsidiária de entidade integrante da Administração Indireta do Estado de Minas Gerais" é ato administrativo que "goza de presunção de legalidade, visto que legitimamente apreciado e deliberado pelo egrégio Conselho Superior do Ministério Público mineiro".

Segundo Assad, "a concessão da tutela liminar ora pretendida, sem oportunizar a oitiva da Administração Superior do Parquet mineiro, afigura-se como medida que afrontaria a própria autonomia administrativa da unidade ministerial, primado constitucional que compete ao Conselho Nacional do Ministério Público tutelar permanentemente".

O conselheiro determinou que fosse ouvido, antes, o presidente do Conselho Superior do Ministério Público de Minas Gerais, José Torres Marques, concedendo prazo de 15 dias para se manifestar acerca dos fatos.

No último dia 20, o Procurador-Geral de Justiça Adjunto Geraldo Flávio Vasques solicitou ao CNMP a prorrogação de prazo por mais 30 dias.

(*) PCA - 1197/2011-65
Escrito por Fred às 09h45

Comentário: 


Curioso isso. O que faz uma instituição que durante décadas lutou bravamente para sair da condição de órgão subalterno às Secretarias de Justiça dos Estados e alcançar o posto de órgão autônomo, permanente e essencial ao funcionamento da Justiça, com status equivalente àquele oferecido aos próprios Poderes de Estado, tornar-se agora refém de ocaionais, inexplicáveis e ilegais solicitações de instâncias políticas para que seus integrantes passm a ocupar  cargos na Administração Direta, incluindo - como diz a matéria - empresas de economia mista, nessa espécie de transtorno de identidade ? Mesmo no MPSP essa prática tem se tornado freqüente, existindo colega a ocupar diretoria de estatal, sem contar o abuso de cessão para o Executivo de colegas que ingressaram após 1988, apesar da expressa vedação do art. 128, V, da CF/88. E tudo isso com um certo estímulo do Conselho Nacional do Ministério Público, que , ttambém em crise de identidade, oscila entre o controle efetivo da ilegalidade e a expressão de um mero sentimento corporativo. Incompreensivelmente, o Ministério Pùblico nega os pilares principiológicos lançados na Carta Política, recusa seu status de equivalência com a magistratura, como ficou claro após a EC45, arriscando-se em uma aventura pelos abismos perigosos da política partidária, em um revival daquele cenário paulista do início dos anos noventa, em que a tal "república dos promotores" representou um retrocesso e um cenário clamoroso de perda de credibilidade. Até quando ?

Julgamento Por E-Mail, Publicidade e Eficiência

Anunciou o TJSP o projeto de iniciar julgamentos de Agravos de Instrumento por correspondência eletrônica entre os membros da turma julgadora, justificando a iniciativa, como sempre, pela necessidade de atender satisfatoriamente, e com brevidade, a solução de milhares de recursos dessa natureza ali pendentes. Afirmam as notícias surgidas acerca da matéria que os advogados das partes envolvidas seriam previamente notificados com a finalidade de se manifestarem definitivamente sobre as respectivas pretensões, com isso garantindo observância rigorosa ao devido processo. Diversas questões, todavia, rondam a proposta. Inicialmente, o fato de não se decidir em sessão aberta pode não ser elemento capaz de garantir celeridade, à medida que não inibe, em princípio, o trâmite burocrático da produção do voto escrito, sua fundamentação etc., aspectos aos quais deve ser atribuída a eventual demora. As sessões públicas de julgamento, nesse aspecto, são apenas o último passo do procedimento recursal, que, ao menos em princípio, não deveriam embaraçar o trâmite regular, a medida que a Corte possa se reunir no ritmo compatível com o volume de trabalho. Assim, é realmente discutível a suposta eficiência dos julgamentos apenas a partir disso, quando em verdade os dispositivos dos arts. 522 e segs. do CPC já permitem meios razoáveis de aceleração da decisão, via, por exemplo, julgamento singular pelo relator nas hipóteses previstas etc. Preocupante, além do mais, é a confusão que se tem feito ultimamente entre os conceitos de eficiência e celeridade. Se de fato, o encurtamento do período de processamento de recursos e demandas pode, sim, ser considerado um elemento presente em termos de eficiência e efetividade do processo, esse fator isoladamente não pode responder pela idéia, que congloba outros aspectos, tais como o bom ajuizamento dos magistrados sobre a questão, a solução mais adequada etc. Não menos relevante, aliás, é o fato de que esse tipo de solução atropela o preceito do art. 93, IX da CF, que propugna pela publicidade dos julgamentos, o que  não é pouco, com o risco de tornar instransparente deliberação carente de publicidade. Sabe-se, claro, que o processo eletrônico é praticamente irreversível, havendo necessidade de uma adaptação legislativa quanto aos procedimentos nesse caso. Todavia, parece também razoável que ele se adapte aos princípios constitucionais e jurídicos, já porque impossível que estes possam ser reescritos para lhe abrirem possibilidade.

segunda-feira, outubro 24, 2011

Ministério Público: Eleições e Órgãos Superiores

Avizinham-se, após novo ciclo de dois anos, oportunidades novas de debate e coleta de opiniões da classe sobre o Ministério Público de São Paulo. Já em dezembro será recomposto o Conselho Superior do Ministério  Público, tendo responsabilidade nisso, em parte, o atual Órgão Especial do Colégio de Procuradores, que, estranhamente, mesmo em fim de mandato, elege três representantes para que tomem assento naquele colegiado, enquanto a classe como um todo se incumbe, paralelamente, da eleição dos seis nomes restantes, uma vez que dois componentes têm assento permanente, ou seja, o Corregedor-Geral e o Procurador-Geral de Justiça. No vindouro mês de março completa-se o período eleitoral com o pleito destinado à formação da lista tríplice para o cargo de Procurador-Geral de Justiça, cujas candidaturas, ao menos em princípio, já se encontram postas e "nas ruas", como se diria no jargão jornalístico. A destacar nesse ponto a relevância desses ciclos revisionais a cada biênio, o que tem ajudado a classe a se rever, a se reformular, e com espírito participativo prestar sua colaboração ao aperfeiçoamento institucional em todos os sentidos, seja por meio de críticas ou sugestões, ou ambas as coisas.  Forçoso reconhecer que o ciclo eleitoral fixado entre os meses de dezembro e março do ano subseqënte, quando diversos órgãos superiores têm sua renovação providenciada, não foi concebido impensadamente, e, antes, no claro propósito de destacar o inevitável entrelaçamento entre els, cujas funções e atribuições, malgrado próprias, são notoriamente interdependentes. Aspectos bastante relevantes da vida institucional, como, por exemplo, o Plano de Atuação, o Afastamento da Carreira, as Promoções e Remoções são produto de atos complexos, nos quais interferem essas diversas instâncias. Com isso se pretende sublinhar que nenhum dos pleitos pode ser visto pela classe de modo isolado, como se fossem parte de realidades autônomas e separadas por um hiato de poder. Seria ótimo que cada colega compartilhasse essa visão, pois a gestão institucional passa pela democrática via do controle das ações da Procuradoria-Geral de Justiça pelo Conselho Superior e pelo Órgão Especial do Colégio de Procuradores, daí porque a formação de maiorias nos colegiados têm grande importância, já que determinantes para a implementação de políticas internas, à medida que estejam, ou não, dispostas à promoção de um debate mais ampliado sobre projetos oriundos do Executivo institucional (PGJ). O poder residente, também, nos colegiados, pode ser manejado de modo positivo ou negativo, adotando-se postura pró-ativa, propositiva,  ou apenas passiva, sob o entendimento de que o pleito eleitoral, ao aprovar nas urnas a candidatura "a" ou "b" implicaria em referendum permanente a qualquer iniciativa do empossado na chefia da instituição, quando em verdade a aquisição do mandato não resulta nisso, mas apenas no início de uma relação sujeita às circunstâncias temporais e factuais em permanente mudança. É saudável, sempre, o debate, a contraposição de idéias, à míngua de quê, nada floresce em boas condições. Por isso, saudando o interesse da classe, sempre renovado, em contribuir para isso, se sugere a glosa das idêias circulantes, o real compromisso de cada candidatura para com aquelas formalmente defendidas, o que se atesta não somente no dircurso aparentemente fecundo, mas também na prática cotidiana no passado.  Uma gestão interna, notadamente ao nível da Procuradoria-Geral, tanto pode ser politicamente forte internamente e fraca exteriormente, ou o contrário, politicamente fraca internamente e forte exteriormente, com as respectivas implicações. Faz-se imprescindível saber o que desejam os candidatos acerca dessas duas possibilidades, checando custos e benefícios em cada  hipótese, além, é claro, da maior fidelidade possível ao texto constitucional, de um tempo a esta parte tão esquecido, como se ninguém o tivesse de fato querido.

Os Alimentos e o Direito à Educação


É de hoje, ainda, a matéria publicada no site do STJ (www.stj.jus.br), segundo a qual aquela Corte acaba de caçar decisão oriunda do TJSP, que, reformando decisão de primeiro grau, mandou que pai pagasse alimentos à filha com curso superior já concluído, ao fundamento de sua necessidade de complementar a formação acadêmica com curso de pós-gradução em nível de mestrado. O núcleo da decisão traz em si discussão interminável sobre os limites das responsabilidade paterno ou materno-filial pela formação intelectual dos filhos, que segundo a pretensão levada a juízo deveria se estender até o plano da pós-graduação, tendo em vista  a impossibilidade da realização de qualquer trabalho  até sua conclusão. A ponderação de interesses, no caso, resultou em solução desfavorável para a postulante, pois dos pais não se pode exigir que sigam desembolsando valores para essa finalidade até esse nível de formação intelectual, tanto pelo fato de se operar a extinção do poder-familiar com a maioridade ( art. 1635/CC), quando, em princípio, cessa a obrigação de sustento voltado a essa finalidade,  e depois pela evidente não imprescindibilidade do alcance desse estágio intelectual para o perfeito engajamento no mercado de trabalho e possibilidade de auto-sustento. Não fosse assim, seria hoje difícil, senão impossível, estancar a obrigação alimentar, já por ser notória na sociedade a idéia de educação permanente e ao longo da vida, o que representaria um desvio de finalidade em relação à obrigação alimentar.

sexta-feira, setembro 16, 2011

STJ: POSSIBILIDADE DA AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE/MATERNIDADE SOCIOAFETIVAS

"É possível ação de investigação de paternidade e maternidade socioafetiva A busca do reconhecimento de vínculo de filiação socioafetiva é possível por meio de ação de investigação de paternidade ou maternidade, desde que seja verificada a posse do estado de filho. No caso julgado, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em decisão unânime, negou a existência da filiação socioafetiva, mas admitiu a possibilidade de ser buscado seu reconhecimento em ação de investigação de paternidade ou maternidade.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) havia rejeitado a possibilidade de usar esse meio processual para buscar o reconhecimento de relação de paternidade socioafetiva. Para o TJRS, seria uma “heresia” usar tal instrumento – destinado a “promover o reconhecimento forçado da relação biológica, isto é, visa impor a responsabilidade jurídica pela geração de uma pessoa” – para esse fim.

Analogia

A relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, apontou em seu voto que a filiação socioafetiva é uma construção jurisprudencial e doutrinária ainda recente, não respaldada de modo expresso pela legislação atual. Por isso, a ação de investigação de paternidade ou maternidade socioafetiva deve ser interpretada de modo flexível, aplicando-se analogicamente as regras da filiação biológica.

“Essa aplicação, por óbvio, não pode ocorrer de forma literal, pois são hipóteses símeis, não idênticas, que requerem, no mais das vezes, ajustes ampliativos ou restritivos, sem os quais restaria inviável o uso da analogia”, explicou a ministra. “Parte-se, aqui, da premissa que a verdade sociológica se sobrepõe à verdade biológica, pois o vínculo genético é apenas um dos informadores da filiação, não se podendo toldar o direito ao reconhecimento de determinada relação, por meio de interpretação jurídica pontual que descure do amplo sistema protetivo dos vínculos familiares”, acrescentou.

Segundo a relatora, o artigo 27 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) afasta restrições à busca da filiação e assegura ao interessado no reconhecimento de vínculo socioafetivo trânsito livre da pretensão. Afirma o dispositivo legal: “O reconhecimento do estado de filiação é direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, podendo ser exercitado contra os pais ou seus herdeiros, sem qualquer restrição, observado o segredo de justiça.”

Estado de filho

Apesar de dar legitimidade ao meio processual buscado, no caso especifico, a Turma não verificou a “posse do estado de filho” pela autora da ação, que pretendia ser reconhecida como filha. A ministra Nancy Andrighi diferenciou a situação do detentor do estado de filho socioafetivo de outras relações, como as de mero auxílio econômico ou mesmo psicológico.

Conforme doutrina apontada, três fatores indicam a posse do estado de filho: nome, tratamento e fama. No caso concreto, a autora manteve o nome dado pela mãe biológica; não houve prova definitiva de que recebia tratamento de filha pelo casal; e seria de conhecimento público pela sociedade local que a autora não era adotada pelos supostos pais.

“A falta de um desses elementos, por si só, não sustenta a conclusão de que não exista a posse do estado de filho, pois a fragilidade ou ausência de comprovação de um pode ser complementada pela robustez dos outros”, ponderou a ministra. Contudo, ela concluiu no caso julgado que a inconsistência dos elementos probatórios se estende aos três fatores necessários à comprovação da filiação socioafetiva, impedindo, dessa forma, o seu reconhecimento.

O número deste processo não é divulgado em razão de sigilo judicial.

Coordenadoria de Editoria e Imprensa"

Comentário

Esse é um pronunciamento pelo qual a comunidade jurídica vinha esperando. Desde algum tempo há uma lantente divergência de opiniões sobre a possibilidade de investigação da paternidade ou maternidade socioafetivas, mesmo entre aqueles que aceitam vínculos parentais com base nesse elemento. A dúvida sempre esteve ligada dificuldades em se produzir provas suficientes sobre a posse do estado de filho, argumento afastado pelo STJ no acórdão em referência. É importante frisar que mais uma vez ficou assentada a primazia da socioafetividade sobre vínculos genéticos, cada vez mais se acentuando, portanto, a desbiologização da paternidade, como previra o Prof. João Batista Vilela desde sua célebre palestra a respeito, proferida em 1.979. De qualquer maneira, a decisão também reforça a idéia da afetividade como princípio jurídico, abrindo um caminho completamente inovador em matéria de filiação.

terça-feira, setembro 13, 2011

PATERNIDADE; SOCIOAFETIVIDADE X CRITERIO BIOLOGICO

 DIRETO DO S T J:

"Após sete anos de disputa judicial entre pai biológico e pai de criação, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o registro civil de uma menina deverá permanecer com o nome do pai afetivo. Os ministros entenderam que, no caso, a filiação socioafetiva predomina sobre o vínculo biológico, pois atende o melhor interesse do menor. "

Comentário

No site do Superior Tribunal de Justiça se estampa, hoje, notícia que confirma o fato de que naquela Corte, realmente, o princípio da afetividade vem ganhando corpo. A disputa entre pais afetivo e biológico se encerrou com vitória do primeiro, admitida, inclusive, a superioridade do critério socioafetivo. Trata-se de decisão relevante, porque reveladora de uma sintonia da magistratura com princípio de alta relevância no campo do Direito de Família.

quinta-feira, setembro 01, 2011



STJ - Notícia:
"Em situações excepcionais, é possível interceptação telefônica em investigação de natureza civil
É possível a intercepção telefônica no âmbito civil em situação de extrema excepcionalidade, quando não houver outra medida que resguarde direitos ameaçados e o caso envolver indícios de conduta considerada criminosa. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar habeas corpus preventivo em que o responsável pela execução da quebra de sigilo em uma empresa telefônica se recusou a cumprir determinação judicial para apurar incidente de natureza civil.

O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) julgou correta a decisão do juízo de direito de uma vara de família, que expediu ofício para investigar o paradeiro de criança levada por um familiar contra determinação judicial. O gerente se negou a cumprir a ordem porque a Constituição, regulamentada neste ponto pela Lei 9.296/96, permite apenas a interceptação para investigação criminal ou instrução processual penal.

O TJMS considerou que é possível a interceptação na esfera civil quando nenhuma outra diligência puder ser adotada, como no caso julgado, em que foram expedidas, sem êxito, diversas cartas precatórias para busca e apreensão da criança. O órgão assinalou que o caso põe em confronto, de um lado, o direito à intimidade de quem terá o sigilo quebrado e, de outro, vários direitos fundamentais do menor, como educação, alimentação, lazer, dignidade e convivência familiar.

Para o tribunal local, as consequências do cumprimento da decisão judicial em questão são infinitamente menos graves do que as que ocorreriam caso o estado permanecesse inerte. Segundo o relator no STJ, ministro Sidnei Beneti, a situação inspira cuidado e não se trata pura e simplesmente de discussão de aplicação do preceito constitucional que garante o sigilo.

Embora a ordem tenha partido de juízo civil, a situação envolve também a necessidade de apurar a suposta prática do delito previsto pelo artigo 237 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): “Subtrair criança ou adolescente ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar substituto.”

O ministro destacou que o responsável pela quebra do sigilo não demonstrou haver limitação na sua liberdade de ir e vir e não há informação no habeas corpus sobre o início de processo contra ele, nem sobre ordem de prisão cautelar. “Não toca ao paciente, embora inspirado por razões nobres, discutir a ordem judicial alegando direito fundamental que não é seu, mas da parte”, ressaltou o ministro.

“Possibilitar que o destinatário da ordem judicial exponha razões para não cumpri-la é inviabilizar a própria atividade jurisdicional, com prejuízo para o Estado Democrático de Direito”, afirmou o ministro. Tendo em vista não haver razões para o receio de prisão iminente, a Terceira Turma não conheceu do pedido de habeas corpus impetrado pela defesa."

Comentário:

A decisão é interessante. Alude a uma excepcionalidade da situação autorizada, já porque em jogo interesses de criança, cumprimento de determinação judicial etc. A Lei  n.o 9.296/96, nada obstante, apenas autoriza o uso desse meio de prova em hipóteses de investigação criminal. A questão aberta pelo acórdão diz respeito à legitimidade do emprego da analogia legis frente à situação na qual  a regra legal já em si trata, aparentemente, de toda exceção possível à garantia de direito à intimidade, que como categoria jurídica inerente aos constitucionalmente protegidos direitos de personalidade ( art. 5.o, X/CF88), tem estrato constitucional. Pesa, é bem verdade, o fato de interesse de a causa dizer respeito à disputa pela guarda de criança, o que atrai ao campo da disputa a observância da garantia de prioridade absoluta de sua tutela ( art. 227, CF/88), o que, frente à colisão de direitos, fez obrigatória a ponderação de interesses com a conseqüências trazidas pelo acórdão. Sem dúvida trata-se de caso em que o ativismo judicial marca presença uma vez mais, mas com um sentido positivo, já porque fundado em compreensão da lei a partir de uma visão sistemática, o que não deixa de ser positivo.  Entretanto, talvez o acórdão devesse tornar mais clara, apenas, as situações excepcionalíssimas dessa autorização, de modo mais claro, para evitar, por assim dizer, abusos, já que se trata de cenário delicado do direito à intimidade.  

domingo, agosto 28, 2011

Teses da Defensoria Pública de São Paulo - Adoção Intuitu Personae




" Apesar da primazia da adoção cadastral e impessoal estabelecida no art. 50 do Estatuto da Criança e do Adolescente, o rol trazido no § 13 do mencionado dispositivo não pode ser considerado taxativo em observância ao princípio do superior interesse da criança e do adolescente."

A tese acima, da DEFENSORIA PUBLICA DE SAO PAULO, situa seu posicionamento sobre a denominada adoção intuitu personae, explicitando visão favorável à sua viabilidade jurídica, a despeito do aparente impedimento existente por força da exigência do cadastro prévio, ou seja, habilitação, nos termos da Lei. 
Justifica realmente essa visão o postulado do superior interesse da criança e do adolescente, enunciado pela disposição do inciso IV do art. 100, par. único do ECA, o qual, como se sabe, aponta para uma solução conforme a hipótese concreta e segundo diretriz de eqüidade.  
Vale dizer que o Superior Tribunal de Justiça já consagrou entendimento idêntico, dando, assim, suporte a essa tese, como se pode ver:
"RECURSO ESPECIAL -  AFERIÇÃO DA PREVALÊNCIA ENTRE O CADASTRO DE ADOTANTES E A ADOÇÃO INTUITU PERSONAE - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR - VEROSSÍMIL ESTABELECIMENTO DE VÍNCULO AFETIVO DA MENOR COM O CASAL DE ADOTANTES NÃO CADASTRADOS - PERMANÊNCIA DA CRIANÇA DURANTE OS PRIMEIROS OITO MESES DE VIDA - TRÁFICO DE CRIANÇA - NÃO VERIFICAÇÃO - FATOS QUE, POR SI, NÃO DENOTAM A PRÁTICA DE ILÍCITO - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I -  A observância do cadastro de adotantes, vale dizer, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança não é absoluta. Excepciona-se tal regramento, em observância ao princípio  do melhor interesse do menor, basilar e norteador de todo o sistema protecionista do menor, na hipótese de existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não se encontre sequer cadastrado no referido registro;
II -  É incontroverso nos autos, de acordo com a moldura fática delineada pelas Instâncias ordinárias, que esta criança esteve sob a guarda dos ora recorrentes, de forma ininterrupta, durante os primeiros oito meses de vida, por conta de uma decisão judicial prolatada pelo i. desembargador-relator que, como visto, conferiu efeito suspensivo ao Agravo de Instrumento n.
1.0672.08.277590-5/001. Em se tratando de ações que objetivam a adoção de menores, nas quais há a primazia do interesse destes, os efeitos de uma decisão judicial possuem o potencial de consolidar uma situação jurídica, muitas vezes, incontornável, tal como o estabelecimento de vínculo afetivo;
III - Em razão do convívio diário da menor com o casal, ora recorrente, durante seus primeiros oito meses de vida, propiciado por decisão judicial, ressalte-se, verifica-se, nos termos do estudo psicossocial, o estreitamento da relação de maternidade (até mesmo com o essencial aleitamento da criança) e de paternidade e o conseqüente vínculo de afetividade;
IV - Mostra-se insubsistente o fundamento adotado pelo Tribunal de origem no sentido de que a criança, por contar com menos de um ano de idade, e, considerando a formalidade do cadastro, poderia ser afastada deste casal adotante, pois não levou em consideração o único e imprescindível critério a ser observado, qual seja, a existência de vínculo de afetividade da infante com o casal adotante, que, como visto, insinua-se presente;
V - O argumento de que a vida pregressa da mãe biológica, dependente química e com vida desregrada, tendo já concedido, anteriormente, outro filho à adoção, não pode conduzir, por si só, à conclusão de que houvera, na espécie, venda, tráfico da criança adotanda.
Ademais, o verossímil estabelecimento do vínculo de afetividade da menor com os recorrentes deve sobrepor-se, no caso dos autos, aos fatos que, por si só, não consubstanciam o inaceitável tráfico de criança;
VI - Recurso Especial provido.
(REsp 1172067/MG, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/03/2010, DJe 14/04/2010)"



Uma Boa Visão Sobre a União Estável Homoafetiva

As Crianças da Vila Mariana

Na semana passada foi matéria de longos debates a situação das crianças apanhadas em flagrante durante furto em um hotel da Vila Mariana, sua colocação provisória em unidade de acolhimento institucional, deixada sem cerimônias por parte delas. A preocupação mais freqüente em relação a isso, diga-se, teve a ver com a impossibilidade de o Estado mantê-las ali, junto à instituição de acolhida, pois para muitos observadores o mais correto seria colocá-las sob condição na qual não tivessem possibilidade de escolher a rua como seu destino.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei Federal n.o 8069/90, em seu art. 100, I, todavia repudia a reclusão de crianças sob qualquer pretexto, fixando a liberdade como elemento essencial do regime jurídico do acolhimento institucional, medida aplicada ao caso.
As razões da lei, claro, coincidem com a preservação de direitos fundamentais básicos de crianças e jovens nessa situação, ou seja, o relativo à convivência familiar e o atinente à liberdade, essenciais à existência digna desses sujeitos especiais.
É natural, claro, que nenhum deles tem peso absoluto, mas em termos gerais substituir a família em suas responsabilidades por uma instituição acolhedora, sem se dar à ela a possibilidade da evolução no acatamento e desicumbência de suas responsabilidades,   seria nocivo ao ambiente democrático de tratamento à infância pelo qual prima a proteção integral.
Admitir o contrário, retirando crianças das ruas pura e simplesmente, sem intervenção junto à família e demais cuidados recomendáveis, equivaleria ao retorno à época da política de "bem-estar do menor", com substituição sistemática da família pelo Estado por meio de institucionalização freqüente e acriteriosa, o que consistiria numa política higienista sem quaisquer rodeios.
Medidas assim reforçam, a bem da verdade, a dissolução do convívio familiar indispensável, a irresponsabilidade dos pais pelo futuro dos filhos, contrariando ainda o caráter diferenciado da tutela jurídica de seus interesses.
Deve-se compreender também, que o retorno às ruas não significa ausência de cuidados, já porque o caso se encontra na mira do Conselho Tutelar, que segue arbitrando medidas de proteção visando a garantia de seus direitos.